A Adúltera (por Bert Hellinger no Livro As Ordens do
Amor)
Certa vez, em Jerusalém, um homem desceu do Monte das
Oliveiras, em direção ao Templo. Quando penetrou no recinto, alguns eruditos
"justos" arrastavam uma jovem mulher. Cercando o homem, eles a
colocaram diante dele e lhe disseram: "Esta mulher foi apanhada em
adultério. Moisés nos ordenou na lei que seja apedrejada. O que você diz a
respeito?"
Na verdade, não estavam interessados na mulher nem na
ação dela. O que lhes interessava era preparar uma armadilha para um ajudante
que era conhecido por sua brandura. Eles se indignavam com sua indulgência e,
em nome da lei, julgavam-se autorizados a destruir tanto aquela mulher quanto
este homem - que nada tinha a ver com a ação dela - caso não compartilhasse de
sua indignação.
Vemos diante de nós dois grupos de perpetradores. A um
deles pertencia a mulher: era uma adúltera e os indignados a chamavam de
pecadora. Ao outro grupo pertencia os indignados: por sua intenção eram
assassinos, porém chamavam-se justos.
Sobre ambos os grupos pesava a mesma lei implacável, com
a única diferença de que chamava de injusta uma ação má e de justa uma outra,
na verdade muito pior.
Porém o homem que tentavam apanhar na armadilha
esquivou-se de todos eles: da adúltera, dos assassinos, da lei, do ofício de
juiz e da tentação de grandeza. Ele se curvou e começou a escrever com o dedo
na areia. Diante de todos eles curvou-se para a terra.
Quando os indignados não
entenderam os sinais que escrevia com o dedo e continuaram a espreitá-lo e pressioná-lo,
ele se ergueu e disse: "Quem estiver sem pecado, que seja o primeiro a
atirar a pedra." Então curvou-se de novo para a terra e continuou
escrevendo na areia.
De repente tudo mudou - pois o coração sabe mais do que a
lei lhe permite ou ordena. Os indignados esvaziaram o local da cena e se
retiraram, um depois do outro, começando pelos mais velhos.
O homem, porém, respeitou a vergonha deles e permaneceu
curvado, escrevendo na areia. Apenas quando todos partiram, ele se ergueu de
novo e perguntou à mulher: "Onde estão eles? Ninguém te condenou? -
"Não, senhor", respondeu ela. Então, como se partilhasse o sentimento
dos indignados, disse à mulher: "Eu também não te condeno".
Aqui termina a história. No texto que nos foi transmitido
ainda foi acrescentado: "Não peques mais!" Esta frase, como
demonstrou a ciência bíblica, foi um acréscimo posterior, provavelmente de
autoria de alguém que não suportou mais a grandeza e a força dessa história.
Mais alguns comentários. Os indignados e a história
ignoraram a vítima real - o marido daquela mulher. Se tivessem apedrejado a
mulher, ele teria sido duplamente vitimado.
Agora porém, como os indignados não
se intrometem mais entre eles, eles têm a possibilidade de encontrar
amorosamente a forma de se compensarem e reconciliarem, começando de novo. Se
os indignados se intrometessem entre eles, essa solução lhes seria vedada e a
situação ficaria pior, tanto para a acusada quanto para sua vítima.
É o que às vezes acontece com crianças que sofreram
abuso, quando não caem nas mãos de pessoas amorosas, mas de pessoas indignadas.
Estas pouco se importam com elas. As medidas que propõem e impõem, nascidas de
seus sentimentos de indignação, apenas tornam a situação mais difícil para as
vítimas.
Mesmo depois de vitimada, a criança permanece ligada e
fiel ao autor do abuso. Assim, quando o pai é perseguido e destruído, moral e
fisicamente, a criança também morre, moral e fisicamente; ou então, mais tarde,
um de seus filhos expiará por esse fato. Esta é a maldição da indignação e a
maldição da lei que justifica.
O que, portanto, deveriam fazer os ajudantes que agem a
partir do amor?
Eles renunciam a fazer dramas e buscam caminhos simples
que possibilitem um novo começo às vítimas e aos autores do abuso, de forma
mais consciente e suave. Em vez de dirigir o olhar para uma pretensa lei
superior, vêem apenas seres humanos, sejam perpetradores ou vítimas, e se
incluem entre eles. Sabem que somente a lei se apresenta como se fosse de
bronze e eterna. Na terra, tudo é passageiro e cada fim é seguido por um novo
princípio. Sua ajuda é humilde e tem amor por todos: pelas vítimas, pelos
perpetradores, pelos incitadores ocultos e pelos vingadores, entre os quais
eles próprios já figuraram alguma vez.
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